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A “Revolta Escrava” do Engenho Novo. Em Jacarepaguá também teve luta!

Por Leonardo Soares*

A sociedade brasileira foi ensinada por décadas, na verdade, quase que por um século inteiro que os negros e negras escravizadas foram libertados por uma ação bondosa da princesa Isabel. Assim, o 13 de maio de 1888 e aquilo que representou, a libertação do povo negro, só teria se dado graças a um surto de benevolência do Império (sustentado por décadas pelo suor e sangue dos escravos) e das elites brasileiras. Para que houvesse tal desfecho, os próprios escravos teriam contribuído nada ou quase nada. Só lhes restando festejar a data e enaltecer pelo feito a “Princesa Redentora”. Nada mais falso.

Pesquisas recentes do campo da História do Brasil têm demonstrado que as lutas efetuadas por esses mesmos escravos cumpriram papel importantíssimo no movimento de derrubada do regime escravocrata.Longe de terem assistido a tudo passivamente, como se apenas lhes restassem torcer pelo sucesso das lutas abolicionistas promovidas – em nome deles – por “homens livres” membros da elite branca, essas pessoas lutaram e sacudiram com o regime, e muito.

Muito pelo contrário, em que pese as limitações e intensa opressão gerada pela condição escrava imposta pelo sistema da época, aqueles homens e mulheres foram agentes de sua própria história, seja fugindo, constituindo quilombos, boicotando ou sabotando a produção, recorrendo à Justiça. Ou seja, se rebelando de diversas maneiras contra aquela condição indigna.

Mas é certo também que tais atos de rebeldia se adensaram exatamente na década de 1880, o que explica em boa medida que a Abolição tenha se dado nesse período. A pressão exercida por aquele(a)s agentes tornava insuportável a manutenção daquele “odioso sistema”.

Foram, felizmente, anos difíceis para os “Senhores de terra e de gente”. Em boa parte do Brasil. Do Rio de Janeiro. Em Jacarepaguá. Ali teve luta, sim. Intensa e vitoriosa. Mais precisamente nas terras do Engenho Novo, nas terras onde hoje funciona a Colônia Juliano Moreira.

Em 20 de dezembro de 1887, os trabalhadores escravizados dessa fazenda fizeram greve. Isso mesmo: greve! Motivo: estavam fartos de tantos maus-tratos. Assim cruzaram os braços, “visto lhes ser dada ração dobrada de açoites e muito minguada de alimentação”. E prossegue o Diário do Commércio (09/01/1888, p. 3) – jornal de onde extraímos a notícia desse magnífico evento: a greve foi levada por aqueles trabalhadores até o dia 29 daquele mês. E foi de tal vigor, que o “Comendador-proprietário” teve que fugir, até porque, diante de tanta afronta, acabou perdendo “amor aos belos ares da fazenda”.

Contudo, confirmando a sua índole covarde, o mesmo, durante a fuga, acionou a polícia, “solicitando força para prender dois dos revoltados”.  E então, o comendador-fujão teve que engolir outro revés: a força policial se negou a realizar a repressão desse movimento. Escreveu o Diário: “as praças recusaram-se desta vez ao mister de capitães de matto”.

Os acontecimentos ocorridos nas terras do Engenho Novo (atual Colônia Juliano Moreira) são emblemáticos: a luta dos escravos era imparável. Ninguém podia mais conter, nem os “Senhores” da elite, mesmo com toda sua empáfia, barbárie, violência e poder. O sistema estava tão desgastado e carcomido, quem nem mesmo a polícia lhe reconhecia legitimidade. Nem ela!

Que acontecimentos. Eles foram, digo, são inspiradores.

.* Pesquisador do IHBAJA e professor de história da UFF Campos

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