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  • Jornal Abaixo Assinado

A Associação de Pequenos Lavradores de Jacarepaguá

Leonardo Soares dos Santos*


A Liga Camponesa de Jacarepaguá foi criada no segundo semestre de 1946. Tinha como finalidade defender os interesses dos pequenos lavradores da região, em especial os posseiros e arrendatários.

Com poucos meses de vida, o seu principal patrocinador, o Partido Comunista do Brasil (PCB), seria colocado na ilegalidade pelo Tribunal Eleitoral em maio de 1947. A Liga seria fechada logo a seguir, como todas as entidades ligadas ao partido vermelho. Os pequenos lavradores perdiam a sua principal organização. Mas não por muito tempo.

Empurrado para a clandestinidade, o PCB vai aos poucos conseguindo se reestruturar, formando quadros e organismos para atuar tanto na área urbana como nas áreas rurais. Parte do movimento de pequenos lavradores do Sertão Carioca, como então era chamada a zona rural da cidade, parece acompanhar esses passos. Novas entidades são criadas na região como as Associações de Pequenos Lavradores (Mendanha, Jacarepaguá, Guaratiba e Santíssimo). Até mesmo encontros como Congressos e Assembléias são novamente realizados. Sempre na sede das Associações – que por sinal, no caso de Jacarepaguá, era a mesma da Liga. Ou seja, o movimento de pequenos lavradores procura readquirir no início da década de 1950 a configuração que ele tinha até maio de 1947. Mas para que isso se cumpra, o movimento teria que readquirir também um outro aspecto, na verdade, a mais importante em termos de sua visibilidade: o comparecimento de membros do movimento, com seus reclamos e bandeiras, no centro da cidade.

Em agosto de 1954 lá estavam “dezenas de lavradores” entregando um memorial com reivindicações de “mais de 20 mil posseiros de Jacarepaguá, Santa Cruz e Campo Grande”. A comissão era “encabeçada” por Pedro Coutinho Filho, militante comunista, advogado que atuava em diversas campanhas do PCB tanto no Sertão Carioca como na Baixada Fluminense. Muitas das reivindicações entregues já apareciam nas Ligas de 1946: crédito fácil e barato “sem burocracia e sem pistolão”; redução de impostos; garantia de mercado para sua produção; medidas contra intermediários; melhoria das estradas; máquina para preparar a terra, sementes, ração, inseticidas; postos de saúde, escolas, água encanada e luz. Porém, talvez como conseqüência do trabalho de advogados envolvidos no movimento, podemos verificar uma maior precisão na elaboração de reivindicações ligadas à questão da manutenção da posse da terra, a saber: levantamento do cadastro de todas as glebas do Distrito Federal; prazo não superior a 6 meses para propriedade plena para posseiros, arrendatários etc., que é, segundo eles, uma “tradição de mais de 30 anos”; e, a participação dos lavradores na organização dos cadastros de terra.

No mesmo ano vemos representantes dos pequenos lavradores introduzirem duas significativas inovações em suas manifestações no centro da cidade. A primeira diz respeito ao esforço em articular as demandas do movimento carioca com o dos lavradores da Baixada Fluminense. Assim, representantes de Jacarepaguá, Coqueiros e Mendanha vão à Câmara Municipal junto de uma comissão de Xerém. Esta vai, é importante frisar, com o estrito fim de demonstrar solidariedade, já que a Câmara não tinha qualquer tipo de jurisprudência sobre as terras da Baixada Fluminense. Depois se encaminham para o Senado Federal, onde todos registram a denúncia de violência cometida pela polícia do estado do Rio de Janeiro em Xerém. Uma outra reivindicação apresentada contém nela mesma uma tentativa de articular o movimento com um outro, de caráter urbano, como é o dos moradores de favelas do Rio de Janeiro: os representantes dos pequenos lavradores pedem que o Senado verifique, “como estão fazendo com os ‘proprietários’ das favelas”, os “duvidosos títulos dos grileiros”. Cerca de um ano depois, diversas representações comparecem à Câmara Federal e ao Palácio Guanabara. Neste momento as reivindicações sobre a questão da posse da terra passam a monopolizar a pauta do movimento, ou melhor, a pauta apresentada por ocasião das manifestações públicas dos pequenos lavradores por meio de comissões de representantes. Esta tendência acaba não se confirmando um ano depois pelas comissões de lavradores de Jacarepaguá, Campo Grande, Guaratiba e Santíssimo que comparecem à Câmara Municipal. Novamente se vê o tema da desapropriação das terras da região ser levantado, mas é acompanhado de outros reclamos: zona agrícola mal servida de condução, especialmente Jacarepaguá; grande dificuldade de irem às feiras, principalmente aos domingos; iluminação ruim; monopólio de “atravessadores nas feiras”; preços baixos dos gêneros perecíveis.

As Associações seguiriam sendo muito atuantes até meados da década de 50, quando teria sua denominação alterada para Associação Rural de Jacarepaguá. Mas as formas de luta e mobilização seguiam sendo as mesmas das suas antecessoras.

*Professor de História e Pesquisador do IHBAJA

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