Nações Indígenas em Jacarepaguá
Uma taba no Rio Quinhentista – História de nossa região
Takûarusutyba & YaKaré Upá Guá
*Por Marcos André
No período pré-cabraliano, nossa costa era habitada por inúmeras nações indígenas, cuja língua-matriz era o tupi-guarani e outros dialetos. No recôncavo, na baía da Guanabara, surgiram muitas aldeias e enormes clareiras dentro da espessa floresta, as tabas, que marcavam seus territórios antes do colonizador. Cada aldeia tinha nome, encantos, lendas e costumes; a prosperidade de umas sobrepujava a de outras, e a rivalidade era sempre defendida com arco e flecha, em intermináveis lutas, muitas delas bem sangrentas, na ponta do tacape. Antes dos primeiros colonizadores aqui desembarcar, a velha baixada de YACARÉ UPÁ GUÁ era um grande oásis entre o mar e o sertão, cuidado por Tuba ou Xeruba, pai em tupi antigo.
Um grande Eldorado. O lendário peabiru indígena riscava todo o nosso território oeste, terminando na Tapera da Barra da Tijuca, antigo sambaqui da reserva, que tinha início na grande baía a leste, Kûanãbará ou Guanabara. Era por meio de tabas, caminhos tortuosos, alagadiços, pântanos que se chegava à estreita garganta do vale do Marãngá, ao oeste, onde o sol se põe e sobre uma colina antes do grande mar. Takûarusutyba, a velha taba tupinãmba, no coração do sertão de Jacarepaguá, descortinava-se pela flora e fauna. Protegida entre seus velhos guardiões naturais, os maciços da Tijuca e Pedra Branca. É sobre este mosaico da nossa história pré-colonial que lançamos luz.
Banhada pelo grande rio, cuja topofilia serpenteava a Boiuna até a Taquara, nascia na imensa serra, hoje Parque Estadual da Pedra Branca, a maior floresta urbana do Rio de Janeiro. Takûarusutyba tinha como regalo água fresca e peixes, para uma rica dieta alimentícia, além da caça consumida abundantemente pelo pajé, cacique e curumins. As mulheres colhiam caju e plantavam milho, e estes elementos dariam a bebida fermentada, cauim, para as festas tribais; a farinha de mandioca também servia como base da dieta. Havia ainda os rituais de antropofagia, muito bem relatados pelos missionários quinhentistas franceses Jean de Léry e André Thévet em suas obras. As mulheres também cuidavam da oca, mantinham o fogo aceso, manipulavam o barro e fabricavam a cerâmica mista, muito usada por diversas tribos do recôncavo da Guanabara e no interior do sertão.
Hoje, com o olhar cuidadoso da arqueologia, a equipe do Ipharj vem resgatando este passado, como no trabalho laborioso sobre o cais da Leopoldina e o matadouro de São Cristóvão. Uma história descoberta à flor da pele como o Valongo e o maravilhoso trabalho do IPN (Instituto Pretos Novos).
Atualmente, a lendária Takûarusutyba tem seus primitivos caminhos apagados pela urbanização. Em ruas de nosso bairro encontramos marcas da pré-história colonial. E sobre uma Taquara febril, dorme o quintal da velha taba indígena. No rio Tindiba, onde repousam garças, banhava-se a linda índia Bartira, que encantava os valentes guerreiros das tabas rivais Okaranti, Kotiuá, Tantimã, Payó e Sapopema.
Muitas lutas foram necessárias para resguardar cada palmo do nosso sertão e, após cada combate, surgia o canto de luto ou o brado de vitória, festejada na taba por mais uma batalha ganha. Hoje, cada fragmento arqueológico faz parte do grande mosaico histórico, cujo conhecimento está resguardado, protegido e divulgado pelo Museu da Humanidade, no bairro Anchieta, no Rio de Janeiro.
*Pesquisador
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